sexta-feira, 23 de maio de 2008

Nos deram espelhos e vimos um mundo doente

Ontem, como programa de feriadão de Corpus Christi, fui visitar a mais nova aldeia indígena de Niterói.
Isso porque como eu sou assim, meio "nerd", não podia simplesmente ir a praia no feriado, hehe.
Mas, voltando ao assunto que interessa, eu disse "mais nova aldeia", pois essa aldeia surgiu esse ano, formada a partir de índios que vieram da cidade de Parati e se instalaram sobre um Sambaqui no bairro de Camboinhas, que é um bairro de classe média alta. Dá para imaginar que a associação de moradores de lá está "adorando". Segundo reportagem, a associação encaminhou ofício ao ministério público questionando a propriedade da terra e alegando que os indígenas estão destruindo área de restinga, de preservação ambiental.

Quando li a reportagem, achei engraçado os moradores VIPs questionarem a propriedade das terras. Até onde a minha cultura tupi e niteroiense permite, que eu saiba, Camboinhas era um nome indígena dado a uma frutinha abundante na região. Rezam algumas lendas que misturada com cachaça fica uma delícia, mas eu particularmente nunca vi essa fruta.



Para quem não conhece a história, Niterói (ou águas escondidas) foi a única cidade brasileira fundada por um índio, o famoso Araribóia, que em tupi-guarani quer dizer "serpente da tempestade" ou "cobra-feroz". Ele foi cacique da tribo dos Temiminós, do grupo indígena Tupi, em meados do século XVI. O seu domínio era a ilha de Paranapuã (hoje ilha do Governador). Arariabóia lutou ao lado de Mem de Sá pela expulsão dos franceses das águas da Guanabara e em troca recebeu de presente as terras que ficavam do outro lado da baia (ou da poça).

Então, como assim os índios não tem direito de viver aqui?

Todas essas questões serviram de estímulo para a minha visita de ontem. A princípio, devido a esse conflito entre índios e a associação de moradores, fui meio reticente. Até tinha pensado em levar uma máquina fotográfica, mas achei melhor não fazê-lo. Qual foi minha surpresa ao ver a aldeia lotada de "turistas" tratando os índios como se fossem uma atração de parque. De repente ouço a seguinte frase de 2 meninas visitantes sobre uma criança indígena: "Ai que fofinho, ele tá peladinho". Comecei a achar tudo aquilo surreal e sinceramente não tenho uma opinião formada sobre os rumos daquela ocupação. É certo que os índio tem todo direito, não só pela história do município, mas porque eles estão ocupando uma área de sambaqui, o que por lei é considerado como terras indígenas.

Não é preciso se preocupar com a hipócrita preocupação de destruição da restinga levantada pela associação de moradores, eles já fizeram isso muito antes que os índios. Sabe aqueles condomínios da barra que desmatam a área de restinga e colocam grama e uma bromélia perdida para dizer que preservam a vegetação de restinga? Então, lá é a mesma coisa.
No local onde estão as ocas, havia apenas capim e só perto da lagoa, em área não ocupada pelos índios, há vegetação típica de restinga. Do lado das ocas tinha uma estufa com mudas mas eu não consegui entender se isso pertencia aos índios ou a algum outro projeto.

Só para finalizar, o título do "post" foi tirado da música "Ìndios" do Legião Urbana. Foi até meio irônico ter ido lá no feriado de Corpus Christie que é um feriado da Igreja Católica que celebra a presença de Cristo na Eucaristia. Neste dia, todo católico é obrigado a ir a missa, e eu fui visitar uma tribo que até hoje sofre com as consequencias da dominação e catequização.
Araribóia não fugiu a regra e para virar um homem importante, foi batizado sobre a alcunha de Martim Afonso em homenagem ao nobre português Martim Afonso de Souza. Martim vem do latim e quer dizer guerreiro e Afonso, do grego, nobre, diligente, atencioso.

As reportagem sobre a ocupação dos índios está em
http://g1.globo.com/Noticias/Rio/0,,MUL456844-5606,00-ALDEIA+EM+PRAIA+DE+NITEROI+OPOE+INDIOS+A+DONOS+DE+CASAS+DE+LUXO.html

sábado, 17 de maio de 2008

Outra opinião

No último "post" comentei como casos explorados pela mídia tiveram impacto nas minhas últimas aulas. Um desses casos foi o envolvimento do jogador Ronaldo com travestis. Hoje assisti a um vídeo no YouTube com um comentário do cantor Caetano Veloso sobre o tema. Como eu concordei bastante com o que ele disse, e acho que o que ele fala no final é o que realmente deveria ter sido valorizado nesse caso.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Vamos falar sobre ...?

Lembra-se que na descrição do blog eu disse que se tudo desse errado eu ia apelar??? Calma, eu não vou apelar, ainda não, é que uma coisa me chamou atenção nas aulas dessa semana: o interesse dos meus alunos por sexo.
Os alunos em questão tem em média 12 anos, ai você pode pensar, nada mais natural do que eles pensarem bastante sobre isso, não é mesmo? Afinal os hormônios sexuais deles estão atingindo níveis nunca antes alcançados. Mas a questão é que as perguntas dele não são triviais, eles tem perguntado sobre questões relacionadas a zoofilia, pedofilia, incesto, abuso e por ai vai.
Isso realmente me surpreendeu, afinal, eles aparentemente não passam por situações semelhantes e nessa faixa-etária é comum o interesse por coisas mais triviais como masturbação, menstruação, etc.
Comecei então a investigar e foi ai que o tão falado "papel da mídia" se fez presente. É comum responsabilizarmos a mídia por questões preponderantes em nossa sociedade como se ela fosse uma espécie de entidade que nos manipula. Entretanto, os defensores da mídia, dizem que ela é simplesmente um reflexo da nossa sociedade.
Não vou me ater aqui, neste "post" a discutir sobre isso e sim dar exemplo de notícias que são digamos "jogadas" pela grande mídia em qualquer horário e que, pelo que pude perceber, fizeram com que emergisse em meus alunos questões relacionadas a sexualidade.
O primeiro caso foi o do jogador Ronaldo, que se envolveu com travestis. Parece-nos já banal zombar da atitude do jogador, mas dessa situação surgem questões relacionadas ao gênero e a orientação sexual.
O segundo caso é do austríaco que manteve uma filha presa, sofrendo incesto e abusos constantes.
Outro caso bem comum são os espaços destinados a pedofilia na internet.
Hoje, não basta a um professor discutir apenas questões relacionadas a reprodução e a sexualidade considerada dentro de uma normalidade (normalidade no sentido de maioria e não de correto). Os adolescentes são "bombardeados" por casos como os citados acima, em um momento em que ainda estão começando a entender sobre sua própria sexualidade.
Na dúvida de como abordar certos temas, pelo menos em relação aos abusos, tentei deixar claro para eles que qualquer imposição é uma forma de abuso e que nenhum menor é responsável por uma atitude indevida de um adulto. Além disso, tentei mostrar as formas de denuncia, explicando inclusive o dever de todo responsável (o que inclui professores) de denunciar esses casos ao conselho tutelar.

Ah! Para quem é professor ou apenas se interessou pelo tema educação sexual, recomendo fortemente assistir ao filme "Kinsey, vamos falar sobre sexo?" disponível em locadora. Kinsey foi um biólogo que se propôs a estudar a sexualidade humana, publicando um famoso livro intitulado "Relatório Kinsey". O mais interessante que o que motivou os estudos de Kinsey sobre o tema foi a própria repressão sexual que ele sofreu em sua criação, o que acabou tendo conseqüências em seu casamento. Até então, ele estudava diversidade de vespas.
Aos mais reprimidos, aviso logo que o filme tem cenas de sexo, então não convide seus avós (ou qualquer outro parente) para assisti-lo com você em um domingo a tarde, a não ser que seus avós e você sejam pessoas bem liberais.

domingo, 4 de maio de 2008

Humanizando a natureza

Um dos principais problemas que enfrento com meus alunos é o fato de que eles humanizam demais a natureza. As pessoas em geral fazem isso, e nesse processo, vêem intencionalidade e moralidade na ação de animais e utilidade nos demais seres.

Para citar um exemplo, em uma prova, vários alunos meus disseram que o mosquito da dengue não tem "culpa" de nos picar. Agora imagine, um mosquito lá tem culpa, ou qualquer outro sentimento humano?

Já as plantas, que em geral nem é visto como ser vivo, existem para limpar o ar e produzir o oxigênio para nós respirarmos. Entretanto, se olharmos do ponto de vista evolutivo, a fotossíntese surgiu muito antes de qualquer animal, então como ela pode existir para servir a estes animais?

Podemos perceber claramente esse processo de humanização em animações como as da Disney. Os animais tem atitudes humanas e até características físicas humanas (são bípedes, tem visão binocular). Sempre penso no exemplo do nemo. Na natureza, um peixe com uma nadadeira deformada seria facilmente devorado, mas no caso do filme, todos os seres do mar se preocupam com ele.

Essa visão sobre natureza poderia ser interessante do ponto de vista conservacionista. As campanhas de preservação de animais bonitos e "fofos" como baleias, golfinhos, são mais bem sucedidas. Li uma reportagem no G1 sobre isso: as pessoas tendem a gostar de animais aos quais associam características valorizadas em seres humanos (como beleza, força, coragem, justiça) e a rejeitar alguns animais pelo mesmo motivo. Assim, lutando pela conservação de uma espécie "querida", preservamos o ambiente onde ela vive e as outras espécies presentes neste ambiente. Um aluno meu da graduação deu o exemplo da onça, pois para cada onça sobreviva é preciso preservar 50 km2. É claro que também é importante desmistificar essa idéia de que alguns animais são bons e merecedores de atenção e outros são desprezíveis e nesse processo é preciso combater essa visão humanizadora sobre os demais seres vivos.

O engraçado é que ao mesmo tempo que as pessoas humanizam a natureza, elas vêem os seres humanos como seres a parte dela. Costumo fazer uma associação desse pensamento com o mito da criação. Nele, a natureza foi feita para servir ao homem, mas ele foi expulso do paraíso, enfrentando toda sorte de situações inóspitas. Assim, a natureza ora pode representar um paraíso para onde queremos voltar, algo a nos servir, ora pode representar coisas ruins a serem dominadas. De qualquer forma o homem pode dispor da natureza.

As visões sobre o utilitarismo da natureza tem caído por terra desde o último século, mas muitas vezes elas permanecem lá no nosso inconsciente.

Reportagem: http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL451681-5603,00-ENTENDA+A+BIOINTOLERANCIA+BIZARRA+MANIA+DE+ACHAR+QUE+ALGUNS+BICHOS+SAO+VILO.html

sábado, 3 de maio de 2008

Indignação (só mais uma)

Já que a última postagem foi de desabafo, esta vai ser de indignação.

No começo da semana, assisti a uma reportagem que dizia que "um homem suspeito de chefiar o tráfico de drogas no morro do Cantagalo, na zona sul do Rio de Janeiro, foi preso com um crachá de vigia da Construtora OAS, responsável pelas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)."

Recentemente fui convocada para um concurso para o magistério. Entre os documentos exigidos, constava um atestado de antecedentes criminais. Para ter esse atestado, fui a um cartório e gastei 23 reais para obter o tal atestado.

Ou seja, eu, uma pessoa idônea, tive que pagar para provar minha idoneidade e exercer meu trabalho de professora, enquanto um fora da lei é contratado como segurança de uma empresa que recebe verba públicas.

Mais uma das muitas maluquices que aturamos nesse país da impunidade!!!

"O Brasil é o país do futuro..." Cadê esse futuro?